STF condena deputada Carla Zambelli e hacker Delgatti em decisão unânime

Imagem: divulgação
Em decisão unânime, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e o hacker Walter Delgatti Neto, nessa sexta-feira (16/05), na Ação Penal (AP) 2428, pelos crimes de invasão de sistema informatizado e falsificação de documentos públicos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A sentença, proferida em sessão virtual, impõe a Zambelli 10 anos de reclusão em regime inicial fechado, multa de dois mil salários-mínimos, indenização solidária de R$ 2 milhões e perda automática do mandato parlamentar. A condenação decorre de ações realizadas entre agosto de 2022 e janeiro de 2023, quando Delgatti invadiu o sistema do CNJ e adulterou decisões judiciais sob orientação da parlamentar.
O hacker foi condenado a 8 anos e 3 meses de prisão. Um dos documentos fraudados chegou a simular um mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes.
A decisão do STF impõe diretamente a perda do mandato da parlamentar, alegando aplicação automática do artigo 55, inciso VI, da Constituição Federal. Contudo, o artigo 55, §2º, da mesma Constituição estabelece que a perda de mandato de parlamentar condenado criminalmente deve ser decidida pela Câmara dos Deputados, por maioria absoluta, em votação nominal.
Além disso, o Regimento Interno da Câmara dos Deputados (RICD) disciplina a matéria no Art. 240, que trata da instauração de processo disciplinar por ato incompatível com o decoro parlamentar, a ser analisado pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar. Já o Art. 55, §2º, da CF prevê que, nos casos de condenação criminal transitada em julgado, a perda do mandato será decidida pela Casa Legislativa respectiva, o que, neste caso, exige ação da Câmara e não apenas decisão judicial.
Art. 240. Perde o mandato o Deputado:
(...)VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.
§ 3º A representação, nos casos dos incisos I e VI, será encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, observadas as seguintes normas: (“Caput” do parágrafo com redação dada pela Resolução nº 25, de 2001 e adaptada à Resolução nº 20, de 2004, conforme republicação determinada pelo Ato da Mesa nº 71, de 2005). 

I - recebida e processada na Comissão, será fornecida cópia da representação ao Deputado, que terá o prazo de cinco sessões para apresentar defesa escrita e indicar provas;
II - se a defesa não for apresentada, o Presidente da Comissão nomeará defensor dativo para oferecê-la no mesmo prazo;
III - apresentada a defesa, a Comissão procederá às diligências e à instrução probatória que entender necessárias, findas as quais proferirá parecer no prazo de cinco sessões, concluindo pela procedência da representação ou pelo arquivamento desta; procedente a representação, a Comissão oferecerá também o projeto de resolução no sentido da perda do mandato;
Ao desconsiderar esse rito constitucional e regimental, o STF impõe, por via judicial, uma consequência política cuja execução depende formalmente do Poder Legislativo. Tal postura evidencia uma escalada de protagonismo judicial que tensiona os princípios da separação dos poderes.
Ainda que os crimes imputados à deputada fossem hipoteticamente graves, o precedente aberto por essa decisão do Supremo levanta questionamentos sobre a legalidade do cumprimento imediato da perda de mandato, sem deliberação da Câmara. A interpretação extensiva do STF sobre sua competência para aplicar sanção política diretamente desconsidera os trâmites regimentais e, potencialmente, fere o devido processo legislativo.
Especialistas em direito constitucional alertam que essa ampliação de poderes judiciais não está prevista expressamente na Constituição e pode configurar interferência indevida em outro Poder da República. O Parlamento, neste caso, corre o risco de se ver reduzido a mero carimbador de decisões judiciais que extrapolam a jurisdição penal e invadem o campo político.
Os advogados da parlamentar ainda podem interpor embargos de declaração, que não alteram o mérito, mas podem postergar o trânsito em julgado. Após a condenação definitiva, para que a pena seja executada, o STF precisará comunicar oficialmente à Câmara dos Deputados. Nesse momento, abre-se espaço para a instauração de processo no Conselho de Ética, conforme prevê o Art. 240 do RICD, e posterior deliberação em plenário.
A jurisprudência da própria Corte, como nos casos de parlamentares anteriormente condenados, reconhece que a decisão sobre a perda de mandato pertence à Câmara, não podendo ser imposta automaticamente. Se o STF mantiver a atual postura, estará não apenas desconsiderando precedentes, mas reescrevendo unilateralmente a lógica institucional da democracia representativa brasileira.

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